Atendimento
O cuidado em saúde mental nos hospitais psiquiátricos
Permeados por tabus, locais ainda desempenham papel importante; em Pelotas, Hospital Espírita é referência
Foto: Jô Folha - DP - Existem 287 leitos psiquiátricos disponíveis à comunidade na região
Pouco mais de 20 anos após a Reforma Psiquiátrica, que passou a mudar o formato de atendimento em hospitais psiquiátricos no País, o funcionamento dessas instituições ainda é permeado de tabus e preconceitos na comunidade. No mês de setembro, que intensifica as discussões sobre suicídio e cuidado em saúde mental mundo afora, o Diário Popular traz um olhar sobre o funcionamento do Hospital Espírita de Pelotas (HEP), um dos únicos hospitais psiquiátricos do Estado e o maior da região.
O administrador do HEP, Tiago Martinato, avalia que, historicamente, os hospitais psiquiátricos sempre foram retratados para as pessoas, até mesmo em produções de cinema e televisão, como espaços de horror para os pacientes, situação que não é compatível com a vida real. “Isso cria, no imaginário coletivo, uma imagem distorcida da realidade e acaba assustando a população. As pessoas chegam a deixar de procurar auxílio por causa disso”, observa.
Martinato observa que, atualmente, a internação hospitalar de pacientes psiquiátricos é uma medida eficiente para aqueles que não conseguem o tratamento necessário em outras frentes de atendimento. “Existem níveis de cuidado. Existe o paciente que é tratável no consultório, no Centro de Atenção Psicossocial (Caps) ou no Ambulatório da UFPel. Mas tem outros pacientes, que o caso é tão grave que o cuidado tem que ser em nível hospitalar”, observa. Geralmente, um dos principais fatores que levam à internação é o risco representado pelos pacientes a si mesmos e a terceiros.
O hospital para além da internação
A equipe do HEP, que conta com 230 colaboradores, contempla profissionais da Medicina, Educação Física, Enfermagem, Nutrição, Psicologia e outros. “O hospital é muito mais do que apenas a internação. Nós somos o Pronto-Socorro da saúde mental”, define a terapeuta ocupacional do Hospital, Laura Ribeiro. Segundo ela, o espaço é um ponto de referência para desmistificar o atendimento em saúde mental.
Laura destaca, também, as diversas atividades realizadas dentro do HEP. “Durante a internação, nossos pacientes têm um atendimento multiprofissional. Eles fazem atividades todos os dias, durante o dia inteiro, e eles escolhem participar das atividades propostas. Aqui a gente tem muito o viés de que nosso paciente se reinsira na sociedade”, observa. Oficinas de costura, velas e sabonetes artesanais, artesanato, show de talentos, olimpíadas e gincana são algumas das atividades desenvolvidas pelos pacientes. Na Oficina Terapêutica, egressos do serviço também se reúnem semanalmente para receber acompanhamento e desenvolver atividades.
Mudanças ao longo dos anos
Nos últimos 20 anos, enquanto termos como Reforma Psiquiátrica e luta antimanicomial se popularizaram, nomes como ‘manicômio’ e ‘sanatório’ foram ficando para trás. Estas mudanças fazem parte de um movimento mundial que passou a questionar e modificar o tratamento oferecido em hospitais psiquiátricos mundo afora. “A Reforma Psiquiátrica, que tem cerca de 30 anos no mundo, partiu de uma análise das instituições e o resultado foi um horror. Eram simplesmente depósitos de pessoas”, explica o psiquiatra e psicanalista, Paulo Rosa. Idealizada pelo italiano Franco Basaglia, a reforma busca, até hoje, uma humanização do tratamento psiquiátrico. Foi nesse contexto que surgiu, também, o movimento antimanicomial, que preza pelo cuidado em liberdade de pacientes psiquiátricos.
Na prática, no Brasil, a implementação do sistema ainda é questionada. “A proposta da reforma é bem interessante teoricamente, mas não funciona bem até agora”, observa Rosa. Entre as mudanças previstas pela reforma está o incentivo à implementação de alas psiquiátricas em hospitais gerais e a consequente diminuição de hospitais psiquiátricos. Para o diretor técnico do HEP, Dario Post, os hospitais em bom funcionamento, no entanto, são fundamentais para o tratamento humanizado e para a própria luta antimanicomial. “Um hospital psiquiátrico que trabalha bem é a maior luta antimanicomial”, resume.
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